Quando se busca pelo termo “running crews”, o retorno é sempre de grupos formados por corredoras e corredores de classe média. No caso da cidade de São Paulo, esses grupos estão concentrados no Parque do Ibirapuera, Avenida Paulista ou em outros bairros mais próximos da elite da sociedade. Isso não acontece por vontade própria. É natural que quem pense em correr em São Paulo pensa primeiro nesses locais. Existem grupos de corrida em locais distantes e periféricos? Sim, sempre existiram. Mas com o estilo “running crew” não.
Até duas mulheres que eram frequentadoras dos treinos do “Vem c Nois” pensaram: “porque não fazemos isso lá onde moramos”. Esse lugar é o bairro “Cidade Tiradentes” que fica a aproximadamente 35km de distância da Av. Paulista onde a crew comandada pelo Caio faz seus “corres”. “Estávamos no metrô voltando pra casa e pensamos: por que não montar um grupo de corrida na Cidade Tiradentes?” Foi o que Mirian Santos e Senny Neres me contaram quando fui acompanhar o treino da “Tamo Junto C.T. Naquela ocasião, junto com Wesley Gonçalves e Bete Brito, os quatro juntos formavam a crew que corre em um dos bairros mais afastados do centro da cidade e motivam várias pessoas a correr todas as sextas-feiras à noite.
Foto: Robson Silva
O nome da crew surgiu do jeito mais prosaico possível. Míriam disse que toda vez que eles chamavam as pessoas para correr terminavam com a frase: “bora então? Tamo junto!” De tanto repetirem acabaram por escolher esse nome, junto com as iniciais do bairro. Para o entendimento seria “Tamo Junto Cidade Tiradentes”.
Outra característica da fundação do grupo: a maioria das organizadoras dos treinos são mulheres. E elas dizem que isso não é por acaso. Na percepção delas, as donas de casa de várias faixas etárias estavam sempre em casa e raramente saiam para fazer uma caminhada que fosse. Ou estavam cuidando dos filhos, ou estavam em afazeres domésticos. E foi assim que as Míriam e Senny começaram a chamar outras mulheres para correr.
“A gente tinha ideia de levar o mesmo formato de treino que a gente via no Vem c Nois e outras crews que corriam no Ibirapuera e no centro para a Cidade Tiradentes: as caixas de som, a alegria e a corrida sem muito compromisso, mais pela diversão de estarmos juntas. Sem esquecer de quem vem fazer caminhada.” E o perfil de quem participa dos treinos da “Tamo Junto C.T.” é bem esse mesmo: muitas mulheres, algumas correndo e várias pessoas fazendo caminhada.
Tudo é adaptado. A divulgação é feita através de um perfil do Instagram, assim como as outras crews. Mas eles acrescentaram uma estratégia: distribuição de panfletos. “Procuramos fazer divulgação de um jeito bem tradicional. Falamos com a equipe de corridas “Fênix” que é aqui do bairro e eles vieram participar. Até o subprefeito já veio correr. Fica lotado de pessoas. A Polícia Militar se voluntariou pra ajudar a gente fechando o trânsito. É incrível!”
Foto: Robson Silva
Os corres, mesmo acontecendo em plena sexta-feira à noite, também permite que as crianças, filhas dessas mulheres possam participar. Aqui vale uma observação: no dia que eu estive no treino deles para fazer a foto e a entrevista que resultou nesse texto, excepcionalmente, o corre aconteceu em um sábado pela manhã.
Pergunto para o único homem presente na organização dos treinos como é para ele participar: “pra mim é uma honra. Eu só conhecia as três de vista. Nunca tinha conversado com elas, embora eu também participasse de treinos das crews em outras regiões da cidade.” Pergunto em quais delas, e Wesley cita que principalmente ia nos treinos da Damn Gang. “Cheguei a ser pacer da Nike em alguns treinos do Nike Running Club (NRC).”
A participação de Wesley no NRC levou a influência do sistema de treinos do clube de corridas da Nike para dentro da Tamo Junto C.T.: desde as organizadoras e eles atuarem como “pacers” até o uso das caixas de som, hidratação no final e fotos que são distribuídas no final do treino e que, postadas nos perfis das pessoas que frequentam o treino, ajudam a ampliar a divulgação.
Fotos: Robson Silva
No logo da crew está escrito: corremos com respeito, união e diversão. Perguntados o porquê disso Wesley me responde: “esses são os nossos valores. Afinal correr tem que ser divertido e isso que une a galera. E a gente conta sim com o apoio dos comerciantes do bairro. Todos esses nomes que estão nas costas da camiseta foram de empresas que nós batemos na porta e pedimos ajuda. E eles contribuíram de alguma forma para podermos oferecer um treino bacana para quem vem. A gente não tem todos esses nomes para mostrar que a gente está cheio de patrocínio. Somos gratos a todos.”
Daqui 15 dias, vamos conhecer a crew onde o Wesley também corre e uma das que mais representam o espírito original das crews norte-americanas: a Damn Gang.
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