Siga nossas redes sociais

Além da corrida

Corrida para amputados

Avatar photo

Publicados

em

Fala pessoal, tudo bem? Sou o Gustavo e vou contar para vocês um pouco da minha relação com a corrida em 2 fases da minha vida: antes e depois de amputar a perna.

O objetivo é passar um pouco da minha experiência com a corrida após a amputação. Os fatores que influenciam o processo.

Vamos lá!

Um breve resumo da minha história

Sou de Uberlândia/MG, pai de 2 filhas, formado em Administração de empresas, trabalhei em multinacionais por mais de 20 anos, e louco por esportes desde sempre. Já pratiquei de tudo! Tendo a corrida e o tênis os esportes do coração.

Corro desde os 15 anos e até 2016 era corredor de meia maratona, até que fiz minha primeira maratona em 2016 no Rio. Em 2017 corri a maratona de São Paulo e Uberlândia.

Em outubro de 2017 o câncer que tive em 2013 na perna esquerda voltou e em 21 dias precisei amputar a perna.

E aí é uma longa história, mas resumidamente, resolvi mudar toda a minha vida e ir para o esporte paralímpico.

Em janeiro de 2018 comecei no tênis paralímpico com o sonho de disputar as Paralimpíadas de Japão em 2020. Consegui, disputei e foi uma das maiores emoções da minha vida. Entrar na vila paralímpica em 2021 e lembrar que 4 anos atrás estava perdendo a perna foi uma das maiores sensações que já tive.

 Agora o foco são as Paralimpíadas de Paris em 2024.

Mas e a corrida nessa nova fase?

Desde o primeiro dia em que soube que teria que amputar uma das coisas que mais me deixou triste foi o fato de não poder correr mais. Isso era outubro de 2017.

Ao pesquisar vi um mundo de próteses especificas para a corrida e tinha certeza de que um dia teria a minha e voltaria a correr uma maratona com ela.

No início achei que em 6 meses estaria correndo novamente e com minha força de vontade logo estaria correndo uma maratona.

Mas as coisas não são bem assim.

A pessoa quando amputa uma perna tem um primeiro sonho: colocar uma boa prótese para fazer algo muito simples: Andar. Andar como antes.

E não é uma tarefa simples, pois os preços são altos.

Aprender a andar com a prótese é um processo que o tempo varia muito de pessoa para pessoa. São vários ajustes até chegar no modelo ideal do encaixe ( que é onde colocamos a perna).

As próteses são divididas em próteses para andar e próteses para correr, ou seja, a prótese para andar é somente para esta finalidade.

E aí que vem a maior dificuldade para o amputado: adquirir uma prótese de corrida.

Acredito que o segundo sonho dos amputados é voltar a fazer as atividades que fazia antes, seja o que for, e principalmente voltar a praticar uma atividade física.

Tipos de amputação e as próteses/lâminas de corrida

Não sei se é porque sempre fui corredor, mas acho que a corrida mexe muito com o amputado.

Pode ser pelo fato representar tão bem a superação máxima para um amputado, que é o simples fato de correr, correr com suas pernas.

E existe um fator que influencia muito na corrida do amputado: o tipo da sua amputação.

Basicamente existem 2 tipos de amputações, a que preserva o joelho e amputa na canela e aquela que amputa tirando o joelho, que é o meu caso.

Quando é possível manter o joelho é a “melhor” amputação que existe. Além da recuperação ser mais rápida a pessoa consegue fazer atividades físicas praticamente como antes de amputar, como por exemplo: andar de skate, surfar, jogar bola, correr mais facilmente, pois ela tem o joelho.

Já a segunda opção que é a amputação tirando o joelho, que é o meu caso, existe um pouco mais de limitação, pois tanto na prótese de andar como na prótese de corrida é preciso de um dispositivo que faça o papel do joelho. E não é possível fazer tudo que a outra amputação permite.

As lâminas de corrida também não são baratas e aí vem a grande questão.

Conseguir comprar a prótese para andar já difícil, e comprar a lâmina de corrida é uma outra luta.

Isto com certeza é um grande limitador que restringe a quantidade de amputados correndo.

Eu tive muita sorte e agradeço todos os dias.

O Fabrício da IPO de Belo Horizonte, que é uma clínica especializada na venda de próteses e que cuida de mim, além de ter resolvido um problema meu que estava me dificultando a andar, me ajudou muito a conseguir uma lâmina de corrida da OSSUR, que é uma das maiores empresas do mundo do segmento e que hoje sou influenciador da marca no Brasil.

O processo para aprender a correr com a lâmina não é tão difícil, mas requer muito treino e principalmente muita confiança. Já que é uma mecânica totalmente diferente do processo de andar.

Para correr com a lâmina é preciso muito treino de fortalecimento da lombar, do core e da perna amputada. Além dos educativos, todos similares aos que são feitos por todos.

A lombar é muito exigida e para mim é o meu maior desafio.

Hoje eu brinco de correr em função dos treinos de tênis que é o meu foco. Não consigo treinar muito com foco na corrida.

Mas pelo menos 2 vezes por semana vou para a esteira e faço 40 minutos. Geralmente tiros de 30 a 40 segundos e descanso 20 segundos.

Já mata a minha vontade de correr e sempre é uma gratidão enorme.

E para quem sempre foi corredor, os longões de final de semana fazem falta.

Preparar tudo na sexta à noite, separar a roupa, o gel, escolher o percurso, sinto muita falta. Mas faço os meus longões de 3 a 4km e está ótimo.

É possível correr 5, 10 até 21km com o meu tipo de amputação, mas o amputado precisa treinar muito o que já mencionei: lombar, core e a perna.

É um processo como de qualquer pessoa que está começando a correr e tem o objetivo de correr os 21km. Só que logicamente exige um pouco mais de paciência e esforço.

Em 2022 corri minha primeira prova aqui na minha cidade, fiz 5km em 1 hora e 15 minutos. Foi incrível viver o clima de uma corrida novamente.

Toda atividade física é extremamente importante para todas as pessoas, porém para a pessoa amputada ou com alguma outra deficiência, o esporte é muito mais do que uma terapia, é uma maneira de nos sentirmos capazes de fazermos as mesmas coisas, mas de uma maneira diferente, do nosso jeito.

Eu sempre corro e reflito sobre aquele momento. Não tenho a perna, coloco uma coisa encaixada na perna e consigo correr. É uma sensação de tanto poder que é difícil transmitir.

É um privilégio com certeza.

Vejo que a cada dia mais pessoas estão conseguindo adquirir suas lâminas e estão dando os primeiros trotes. Alguns falam comigo, tiram dúvidas no início.

Correr com uma lâmina é um processo, como tudo na vida. Requer treinos, aprendizados, ajustes e paciência.

Tenho o sonho de correr 21km e na hora certa vou tentar realizar. Por enquanto meu foco é 100% no tênis paralímpico e vou matando a vontade de correr dando uns trotes alguns dias na semana.

Espero ter conseguido transmitir um pouco da minha experiência mostrando a realidade de um amputado para conseguir correr.

Grande abraço!

Por: Gustavo Carneiro

Em Alta