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As mulheres não querem uma cantada dos homens. As mulheres só querem correr em paz

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O assédio sexual no desporto sempre existiu, continua a existir, e existe em ambos os sexos. Com a evolução dos valores sociais e culturais, o assédio sexual começou a ser cada vez mais questionado e debatido. Haverá seguramente quem goste de ser abordado na rua por desconhecidos, sentindo isso como uma massagem no ego. Mas quer parecer-me que a maioria das pessoas (falo sobretudo de mulheres, uma realidade que conheço melhor) sente um piropo (cantada/xavexo) como uma invasão da sua individualidade, uma humilhação, e um desrespeito que nos dias de hoje não faz grande sentido. Se não sabem como é que um piropo vai ser recebido por outra pessoa, então não o façam, não invadam o espaço do outro. Na dúvida, o mais sensato e correto é não o fazerem.

Repito: assédio sexual no desporto acontece tanto com homens como com mulheres, mas é mais sério, ameaçador e grave quando é feito de um homem para uma mulher, devido à normal desproporção da força física entre os dois sexos e do quão intimidante um piropo se pode tornar para alguém mais frágil.

Considero-me uma mulher mentalmente forte e que não se deixa intimidar facilmente. Sempre fui muito independente, destemida, com o mindset programado para “se eu não o fizer, ninguém o fará por mim”. Viajei muitas vezes sozinha, viajei várias vezes com desconhecidos, vivi sozinha na Lituânia, vivo sozinha em Lisboa. E foi esta solidão — aliada à vontade de não deixar de fazer as coisas de que gosto por estar sozinha — que impulsionou a minha forma de ser e de estar. Não deixo de treinar na rua seja a que horas for, seja onde for. Mas há mulheres que não são assim. Que não treinam na rua se estiver escuro. Que não correm na rua nos meses de inverno porque há menos luz natural. Que não correm em determinados locais porque têm medo. Que só correm acompanhadas. E este medo é empolado pela possibilidade de serem abordadas por homens, leia-se por “pessoas com mais força física”. E isto é triste. É injusto. É ridículo.

As mulheres, quando abordadas na rua, automaticamente sentem-se ameaçadas porque sabem que se aquele homem quiser, no limite, pode fazer o que quiser, porque será uma luta física desigual. E acho que é muito isto que nós, mulheres, sentimos quando ouvimos um piropo, sobretudo se for daqueles mais agressivos: medo. Nós não conseguimos racionalizar, nós não conseguimos avaliar se a abordagem foi positiva ou negativa, nós só nos sentimos ameaçadas. O nosso batimento cardíaco acelera, sentimos impotência, sentimo-nos desprotegidas e frágeis.

Sabendo os homens disto, e acreditando que 90% das vezes não têm a pretensão de assustar a mulher, penso que vai sendo tempo de repensar o piropo à mulher que passa na rua a fazer exercício.

Há cerca de um mês tive uma experiência de assédio que me motivou a falar sobre este tema nas minhas redes sociais, e agora aqui. Estava de férias em Nápoles, Itália, e estava a preparar a Maratona de Madrid. Tinha o meu treino longo para fazer, acordei cedo e fui. Perto de um parque, fui abordada por um grupo composto por homens, jovens, que estavam sentados num muro, a fumar. Dois deles saltaram do muro e começaram a correr ao meu lado por uns segundos. Foi muito desestabilizador para mim porque fiquei com receio que me bloqueassem a passagem ou me tocassem. Fiquei nervosa, inquieta, com medo.

Estamos em 2023 e isto ainda acontece. Olhares inconvenientes, piadas desagradáveis, piropos sexistas, atitudes invasivas. Fomos educados para “ignorar”, para “não dar relevância”. Mas ignorar só vai fazer com que estas atitudes se perpetuem no tempo. Por isso, temos de falar! Temos de ensinar às gerações futuras que o assédio é errado.

Memorizem: As mulheres não querem o piropo dos homens. As mulheres só querem correr em paz e segurança. Sem abordagens e sem interações.

Título original: As mulheres não querem um piropo dos homens. As mulheres só querem correr em paz.

Por: Sara Veloso

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Permissão para parar

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Somos bombardeados a toda a hora para fazermos mais e melhor. Para não pararmos. Para não desistirmos. Para corrermos atrás dos nossos sonhos. Para ultrapassarmos os nossos limites. Para fazermos o impossível. Entram-nos diariamente pelos olhos adentro, sobretudo nas redes sociais, frases motivacionais de superação, vídeos e imagens incríveis de feitos extraordinários que criam em nós emoções antagónicas. Por um lado, sentimos um ímpeto para fazer mais, por outro lado, sentimos alguma frustração pela dificuldade de realização desse mesmo propósito, que na maioria das vezes, não está de todo ao nosso alcance.

E porque é que vos estou a falar disto agora? Porque senti muita necessidade de parar, de abrandar o ritmo, sobretudo nos treinos de corrida, e tive alguma dificuldade em aceitar isso, tal a quantidade de positividade tóxica que ando a consumir.  

E é por isso que hoje vos quero falar sobre a “permissão para parar”.

Depois de cerca de dez meses dedicada à corrida, com planos de corrida exigentes, ritmos a cumprir e metas para alcançar diariamente, senti, no final de junho, uma grande apatia e desmotivação para correr.

Iniciei a preparação para a Maratona de Lisboa em setembro de 2022 e só parei após a realização da Meia Maratona do Rio de Janeiro, que ocorreu em junho de 2023. Neste intervalo de tempo realizei três Maratonas – Lisboa, Valência e Madrid, e três Meias-Maratonas – Lisboa, Matosinhos e Rio de Janeiro. Naturalmente, que depois destes meses todos dedicada à corrida, sem pausas, o meu corpo estava a acusar exaustão física e mental.

A minha saturação com tudo que estava relacionado com o desporto em geral, e com a corrida em particular, foi de tal forma intensa que eu deixei de seguir várias contas de instagram direcionadas para o incentivo à prática desportiva. Faziam-me sentir pressionada por não estar a corresponder às expectativas dos outros e de mim própria, e com um enorme sentimento de culpa. Ainda me forcei a cumprir o plano de corrida estabelecido, mas não fui capaz. Comecei a arrastar-me, a fazer as coisas sem prazer, desligava o despertador várias vezes antes de ter força para me levantar, ao contrário de outros tempos em que saltava da cama imediatamente, com entusiasmo e vontade.

Tive de tomar uma decisão. E a decisão foi desacelerar até final de setembro. Altura em que irei reavaliar este meu sentir. Obviamente que me tenho mantido ativa. Faço dois treinos de força por semana, em ginásio, e três treinos aeróbicos – bicicleta estática ou corrida.

Durante este processo retirei um aprendizado. E o aprendizado é o seguinte: nós não precisamos de dar o nosso máximo todos os dias. Devemos saber ouvir o corpo e respeitar o nosso cansaço físico e mental. E não há problema algum com isso. Não temos de provar nada a ninguém. Temos de cuidar de nós próprios porque ninguém o fará por nós.

Na verdade, nós precisamos de ter tempo para “não fazer nada”. Às vezes esquecemo-nos da nossa humanidade. Somos humanos e precisamos de resgatar o nosso direito a não fazer nada. A não ter certezas. A não ter uma prova de corrida marcada na agenda.

De facto, não é só o trabalho que enobrece. Temos de parar com a escravidão que nos autoimpomos e limitar a nossa necessidade de provar ao mundo que somos capazes e que somos muito produtivos.

E vocês? Permitem-se a parar?

Por: Sara Veloso

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Eu participei no maior evento de corrida de rua da América Latina – a Maratona do Rio, e fui muito feliz!

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Apesar da corrida ter entrado na minha vida, de forma mais regular e programada, há apenas 2 anos, já participei em várias provas de corrida de rua, em Portugal e em outros países europeus. No entanto, nenhuma das provas foi escolhida por mim. Fui incentiva a fazê-las por amigos ou por questões profissionais, mas nunca tinha sido um desejo meu. E o mais curioso, é que enquanto a maior parte dos meus amigos corredores desejam fazer as World Marathon Majors, o meu desejo é fazer a Maratona do Rio de Janeiro e a Maratona de Atenas. Hoje vou contar-vos a minha experiência na Meia Maratona do Rio de Janeiro.

Após ter concluído a Maratona de Madrid, no final de abril deste ano, senti o vazio típico de quando dedicamos meses a programar um evento e finalmente o evento acontece. Sabem? Um sentimento de vazio, de desorientação, de falta de um propósito. De facto, preparar uma maratona exige dedicação, foco, consistência, e rotina diária. Preparar uma maratona é um processo. Durante alguns meses vivemos diariamente o processo “maratona” e quando ela é realizada, ficamos sem saber o que fazer, sem um objetivo. Foi então que decidi que seria o momento ideal para finalmente ser eu a escolher uma prova. E escolhi! Escolhi fazer a Meia Maratona do Rio de Janeiro. O problema? Conseguir um ingresso. Quando entrei no site da Maratona do Rio, a menos de dois meses da data da prova, o meu ânimo murchou. As inscrições estavam esgotadas. Mas não desisti. Mandei mensagem a todos os amigos que tenho no Rio de Janeiro, na tentativa de conseguir um ingresso, e consegui. No mesmo dia comprei o voo e o hotel. E estava tudo alinhado para correr no maior evento de corrida de rua da América Latina – a Maratona do Rio de Janeiro.

Se eu tivesse de escolher uma palavra para descrever a experiência, a palavra seria surpreendente. Tudo neste evento, desde o momento em que me inscrevi até ao último minuto, foi surpreendente. A comunicação do evento foi muito ativa e bastante elucidativa. Todas as informações relevantes foram partilhadas com antecedência, não só por email, mas também de forma mais apelativa, via Instagram, com conteúdos digitais variados e divertidos, promovidos por caras bastante conhecidas da corrida de rua brasileira.

A hora do levantamento do dorsal foi agendada aquando da inscrição na prova, evitando filas de espera e aglomerados de pessoas na Feira da Maratona. A Feira da Maratona também me surpreendeu. A localização escolhida, a Marina da Glória, é um ex-libris da cidade e deixa automaticamente os turistas que participam na prova de “boca aberta”. A Feira estava dividida em duas áreas, uma área coberta e uma área ao ar livre. A zona ao ar livre tinha várias tendas com as marcas patrocinadoras do evento, vários desafios promovidos por essas marcas e um palco com música e animação.

Fui pela primeira vez ao jantar das massas no dia anterior à prova. O local escolhido para o jantar foi o Rio Scenarium, que é um dos pontos turísticos obrigatórios do Rio de Janeiro. Situa-se no centro da cidade, num edifício do século XIX, com uma decoração muito peculiar, e comida e música típica. O ambiente estava incrível e não acusava a ansiedade típica dos atletas no dia anterior à prova.

A prova, ao contrário do que acontece em Portugal, teve início bastante cedo. A partida foi às 6h da manhã, em várias ondas, para evitar grandes aglomerados de atletas. Os pontos de abastecimento de água e hidratação estavam muito bem identificados e distavam poucos quilómetros entre si.

O único problema com a qual me deparei foi a abertura dos copos de água. Os copos eram selados, e para quem não sabia o truque de abrir a embalagem com o dedo (que apenas me foi contado no final da prova) foi uma grande dificuldade. Outra coisa que é muito diferente, é a quantidade de fotógrafos a cobrir o evento. Em toda a prova há fotógrafos. Sentados no chão. Sentados em cadeiras. Deitados. Em cima das pontes. No nosso lado esquerdo, no nosso lado direito, no centro da pista. Literalmente, os fotógrafos estavam em todo o lado.

De resto, tive imensa sorte com as condições meteorológicas no dia da prova. A minha expectativa era apanhar um dia de calor extremo ou uma chuva forte. Mas felizmente, a temperatura manteve-se muito amena durante a prova.

Para finalizar, correr no Rio de Janeiro foi uma experiência muito positiva. Não senti, em nenhum momento, a insegurança que os órgãos sociais teimam em associar à cidade. É sem dúvida uma experiência a repetir. No entanto, na próxima vez não me ficarei pela Meia Maratona, farei a prova de rua rainha. A Maratona. Quem vem comigo?

Por: Sara Veloso

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Quando as pernas te falharem, correr com o coração. E se o coração estiver desfeito?

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Uma vez disseram-me: “quando as pernas te falharem, corre com o coração”. Achei muito bonito. Mas curiosamente, nas provas longas, o que nunca me falhou foram as pernas. O coração falhou-me sempre. O corpo aguenta tudo, aguenta muito, e somos muito mais fortes e resistentes do que aquilo que nos permitimos ser. E essa permissão é desbloqueada pelo nosso cérebro. Por isso é que é tão importante estarmos psicologicamente estáveis, motivados e equilibrados, para podermos maximizar o nosso rendimento.

A superação física exige inevitavelmente uma superação mental e emocional. Quem é maratonista sabe exatamente do que estou a falar. Quando alcançamos o 30.º quilómetro, muitas vezes, não são as pernas que falham, é a cabeça. A cabeça começa a vacilar. Começa a mandar sinais de autossabotagem ao corpo. “Estou aborrecido”, “tenho fome”, “não aguento mais”, “tenho sede”, “quero ir ao banheiro”, “dói-me a perna”, “doí-me o joelho, (…), nessa altura, até a orelha esquerda começa a doer.

E é esta consciência da importância do factor psicológico na performance física que tem aumentado a procura pelo ramo da “Psicologia do Desporto”.

O rendimento desportivo depende de um conjunto de fatores mensuráveis: treino, descanso, alimentação, suplementação. E de outros que, apesar de não serem tão fáceis de enumerar quanto os primeiros, podem ser desenvolvidos e trabalhados. Isto é, há um conjunto de competências e habilidades psicológicas que os atletas devem dominar no sentido de terem maior capacidade de lidar com as exigências e adversidades nas provas ou nos treinos mais duros. O autoconhecimento, a autoestima, a gestão do stress, a autoconfiança, o controlo da ativação, a motivação, a organização pessoal, e a forma como se lida com lesões, são alguns exemplos apontados na literatura da Psicologia do Desporto como as principais competências psicológicas necessárias ao rendimento desportivo. 

O nosso factor psicológico é tão poderoso que nos faz sentir dores onde elas não existem. Aconteceu-me isso mesmo, recentemente, quando corri a Maratona de Madrid. Um dia antes da prova, comecei a sentir dores na zona da articulação coxofemoral. Pensei em não correr a prova com receio de estar com alguma lesão. Mas não fazia sentido ser uma lesão porque eu tinha cumprido o meu plano de preparação sem dores, e na semana anterior à corrida tinha diminuído a quantidade de quilómetros e o ritmo de treino.

Iniciei a prova com imenso medo, mas a verdade é que a dor desapareceu mal comecei a correr. Era claramente um problema de somatização. A somatização ocorre quando emoções ou problemas de ordem psicológica se manifestam por meio de sintomas físicos.

O impacto do factor psicológico no meu desempenho físico e performance em prova tem-se manifestado com regularidade. Por coincidência, em todas as maratonas que corri não estava bem em termos emocionais. Ou porque tinha terminado uma relação amorosa há pouco tempo, ou porque estava a ponderar terminar uma relação amorosa.

A Maratona de Lisboa, foi sem dúvida, a minha prova mais sofrida. E foi sofrida, não por falta de preparação (sou muito disciplinada, não falho aos treinos), mas porque estava instável e desequilibrada emocionalmente. Sentia-me confusa, frágil, carente, inquieta, ansiosa. E ao contrário do que me disseram “quando as pernas te falharem, corre com o coração”, foram sem dúvida as minhas pernas que se aguentaram firmes. As pernas e a minha determinação e foco. O coração? Esse estava destruído.  

Mas agora vamos olhar para o lado positivo destas histórias menos felizes de correr maratonas com o coração destruído, se a minha média de tempo de realização de uma Maratona é 3h30, e se na próxima prova eu estiver mentalmente forte, qual será o meu tempo de prova? Vamos a palpites?

Por: Sara Veloso

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